Da imagem "Vazioespelhod'água"
Vazio, pré-existente, todo-possível.
É olho fecundo, feito de água limpa e terra
Matérias mães
Ventre do universo-potência
À espera do som primordial que o ondule
A distorcer a perfeita ordem...
Agora há criação
E o espelho a reflete
Refletindo, cria o mundo da imagem, um duplo.
Toda manifestação surge
Todas as possibilidades nascem
E então, num instante, tudo se consome
Espaço vazio- fecundo- vazio espelho d’água."
Raquel Ciorlia
Julho de 2011
Da série "Rito manifesto dos corpos misturados"
"Conchas caem como búzios jogados ao acaso e suavemente encontram seu lugar, umas com as outras, umas nas outras, entregues para serem onde são, fora, dentro, cima, baixo, visíveis ou encobertas à vista, mas isso é apenas um paradigma do olhar. Elas permanecem ali, corpos livres da indiferença, plenas de tato, experimentando o regozijo da união dos corpos. Então, é possível tatear suas memórias.
Desejo essa experiência, que incorpora a presença da matéria, da memória e do sensível e suscita reflexão sobre a relação entre esses aspectos e a respeito dos corpos que os portam.
Então proponho a união das conchas com as pedras, sendo a imagem de uma impressa na outra, o elo simbólico; alquimia realizada a óleo negro e água, consumada pela força corporal que faz interpenetrarem-se as camadas. O primeiro gesto oleoso abre caminho na pedra para tornar possível a existência da imagem: desenho no tempo do olhar tátil, quando agrega-se a memória humana à pétrea. Da matriz ao espaço, esses corpos-memória se condensam espelhados no tecido, trama que suporta a densidade das relações criadas.
As formas e texturas se proliferam no espaço, num infinito de complexidades. O desenho se prolifera em pintura, ponta-seca e litogravura. A substância viscosa ejetada do molusco se propaga em espirais. O sulco na placa de cobre cria vozes. A matriz se reproduz nas múltiplas impressões. A concha se reapresenta em diversos tamanhos, cores, relações e agora, sob nova ótica-tato, retorna ao desenho. Estão manifestas as misturas dos corpos."
Raquel Ciorlia
2009
Hai Kai
Outono
Empoleirado num ramo seco
um corvo
Matsuo Bashô